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Thiane Ávila

Autor: Thiane Ávila

Morte que faz viver

28/3/2015 - São Roque - SP

É de uma insuficiência cardíaca que se mantém o sopro das desesperanças. A transmutação de equivalência que apenas aparenta mudanças. Não há sinergia no desapego das desconquistas, que fazem apenas girar um mundo de relevância simbólica.

Andando com os passos fracos da cura enferma, disputando espaço com o cambalear das articulações que matam por viver com a morte. A nicotina é, pois, a sobrevivência da permanência falha. Respiração emitida da chaminé dos desconsertos.

Não há razão para reclamar o desengano quando o cheiro que vem dele é bom. Trata-se de protestar a impossibilidade da reinvenção. A falta de vontade de deixar de ser, firmada em obrigação apenas para somar mais uma hipocrisia da existência que não deu certo.

Nossa muleta é feita de escarros. O corrimão que serve de sustentáculo é constituído de vácuo, suportando a própria permanência graças ao seu tabaco porfiado.

Cuidado com as asas que deturpam as nuvens no céu. O vento é o antídoto das andorinhas, viciadas na liberdade nicotinada. Neológica por nascença. Prematura pela vida da morte.

Usurpando as reticências, deliberam-se os desamores com as tragadas drogadas dos amantes. Não há limites graças aos anestésicos incumbidos da difusão do vício. Ureia fantasiada de chocolate, embalada com mentol e alcaloide teobromina. Os pulmões estão livres para emitir seu desespero 

As forças da avidez sedenta por negligência agem no seu inverso, transfigurando a rotina em retidão, tornando os dias amortecidos pela insensibilidade do nervo enregelado. É necessário compaixão pela indissolubilidade que ludibria a transparência que separa o que é e o que não é vida.

Os sapatos reservados às mais importantes comemorações da vida são usados no uso da morte. Só há resistência às batidas deliberadas da alma pelo resguardo da parada inevitável. Reconfortante pelo fim. Extasiante pela imprevisão.

Mãos aos céus para cuspir lembranças de venturas abonadas de ócio, abastecidas de importância desproporcional ao sono eterno. Desajustem os relógios para manter a ordem e a pontualidade, pois. A noção de realidade aproxima o movimento apenas com a pausa. A vida com a morte. O sonho com as mãos que veem.

Pobres filhos de mortais vivos os desprecavidos das intolerâncias terrenas. É preciso levar no bolso os usos de primeira necessidade, acendendo com um isqueiro o fogo para queimar as próprias muletas. Matar com a vida o que é morte. E vice-versa.

Não olhe para o lado. A cena é de fumaça e cinza. A dor cheira a mundo e sabe controlá-lo com a sabedoria dos deuses. Endeusa-se, pois, com a consciência da impossibilidade de se negar qualquer coisa. Não existe mentira. A falta ainda é uma verdade. A morte que faz viver é a mentira que valida todas as verdades.

THIANE ÁVILA.

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