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Thiane Ávila

Autor: Thiane Ávila

E quando acabar o mistério

20/5/2015 - São Roque - SP

Sou mil rostos e mil nomes. Sou ninguém e sou todos. Estou em todos os lugares e em lugar nenhum. Sou a metamorfose e a comodidade. A clareza e a escuridão. A sombra e a pele. A libido e a timidez.

A defesa enrustida em forma de zelo talvez seja a pior manifestação da vontade de permanecer. Cada um possui seu próprio mistério, que é fomento e pesticida aos passantes. O real intento é fazer-se notar. A beleza de mostrar-se sem ser descoberto, fazendo da falta de resposta motivo salutar para a insistência nas perguntas.

Poucos são os que compreendem a mímica mental. Esquecemos que ninguém tem os olhos habitados em nosso interior, de modo a adivinhar o que queremos que adivinhem. O requinte de uma necessidade mendiga. Pedindo como trocado, pois, o olhar desencontrado.

A defesa contra o sofrimento gera seus próprios sofrimentos. Ser as ambiguidades requer perder para ganhar. Nenhuma escolha é vitoriosa. Nenhum amor é merecido. É tudo, pois, questão de convencimento e mistério. De lida e insensatez.

Na luta contra os próprios monstros, aprende-se a domesticar a incapacidade de se autodominar, tendo que apreender de imediato as exigências do corpo. Fazendo florescer do breu flores frescas e envelhecidas. A composição completa da paisagem que nem se conhece.

No final das contas, a timidez é a realidade dos amantes. Não ser tímido é a autodefesa. Só se esquiva quem teme por estar se doando por inteiro. É preferível negar-se a oferecer pedaços. O que não é completo jamais preencherá o que nasceu para ser vivido por inteiro.

Mas e quando o mistério acabar? E quando não houver mais nada para ser descoberto? Nesse momento, pois, minhas malas estarão prontas. A passagem só vale a pena pela alteridade da falta. A necessidade de ser ausência para viver presente. Só o vazio delibera a solicitude pelo conteúdo. Assim como apenas o conteúdo depreende a bagagem desnecessária.

A ambivalência é o pêndulo imaterial das relevâncias. O adorno indispensável e indistinguível do que de fato é. Se os extremos não se conflitam é porque o fim ainda não chegou. E se chegou, lamento a frustração de não se ter experimentado.

Desconfio dos nãos embasados em retóricas segundas. É preciso deixar-se queimar para entender a dor. Machucar-se para aprender a superar. E quando for a hora, então escolher o que menos doerá na partida. O que circunstancialmente desenquadrado ainda assim refletirá na lembrança da escolha algum resquício de permanência.

 

THIANE ÁVILA.

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