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Thiane Ávila

Autor: Thiane Ávila

Palavras certas

2/8/2015 - São Roque - SP

A rotina deve, pois, ser desgastante pela incansável procura pela hora certa. Pela comida certa. Pela roupa certa. Pelo sentimento certo. Pela inconstância certa. O limite aniquilador dos despadrões e fuzileiro do desconhecido e do estranho. Sempre em busca das palavras certas, aquelas que só servem para os outros.

Sendo a exceção da vida que se abre ao social e ao orgânico, talvez a principal ameaça à sanidade seja a certeza do normal. A vigilância incansável dos porquês que respondem a tudo. Das frases feitas que condecoram o que não foi feito para ser ornamentado, mas apenas para existir como um nada e sua falta de significados.

Meu discurso eloquente sobre o rarefeito plano das concretudes se fecha mediante um não arrebatador sobre a felicidade. Uma negação à já clichê obrigação de olhar sem as lentes da repugnância e da intolerância o que sobrepuja épocas. O que não desvaloriza valores (para quem acha que eles existam).

A exceção, pois, é o sonho de vida e de morte de qualquer ser vivo. Ao estabelecer a diferença, se é especial. Não se encaixar no plano dos iguais, tampouco aceitar a adequação perfeita, negando a periferia que se tornou centro. A humanidade que, ao contrário, não contrabanda, mas é usurpada a todo o momento pelo aviltante grito dos desesperados por retidão. A linha mais torta da história. 

Eu estou chovendo. Transbordando de amores pela carcaça que cai, cada dia mais, sobre a aridez do solo que me fez andar até então. Descobrir, na essência, a própria essência. Na fertilidade da procriação dos fatos, a maior das penas de ser diferente: a palavra certa que jamais existirá.

Toda a explicação é vã. Toda a expressão que tente ser autossuficiente perante à ignorância selada no nascimento da cultura anarquista-politizada está condenada ao ócio da diligência dos olhares que peregrinam a boa conduta, vendo o caráter com lupa de cegos.

Na tentativa de equalizar as adversidades, pressupõe-se ser são o juiz e o réu. Testemunha-se, sobre placas de imaginativa convenção, o rascunho da sentença e a resposta à falta de pergunta. Ninguém pergunta se pode ser feliz, apenas vive para o ser. Talvez, então, nessa tormenta dos antepassados que subjugam com austeridade a superioridade do próprio sucessor, criam-se as palavras certas.

Nessa crescente de certas palavras, descobre-se, enfim, que as palavras certas são as erradas. Que não é o discurso que deve mudar, mas a forma como se ouve. Ao palestrar, pois, a felicidade, o erro é esmiuçá-la demais para quem não liga para os detalhes, quiçá os entende. A pobreza de espírito não se cura. 

 

THIANE ÁVILA.

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