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Thiane Ávila

Autor: Thiane Ávila

Vivendo embriagada

6/1/2016 - São Roque - SP

Com os contentamentos alucinados por pouco, é preciso embriagar-se constantemente com os nadas. Esperando, pois, do resto o todo, é possível que venha do todo simplesmente nada. Nesse dilema de intensidade fraturada, busco na falta de sentido qualquer esperança sobre uma aposta verdadeira. Alguém disposto a dar o que ainda não tem. Um jogo de truco no bar em final de noite. Bebedeira.

A desmedida de quem não anda só pra frente me fascina. A presunção de saber que há mais que simples progresso. Que vida, pois, não se limita ao alcance de objetivos, mas sim à plenitude de cantar os dias em verso torto. De saber, quem sabe, que a rotina é passo acelerado de quem não aprendeu a caminhar. Só sai do trilho quem conhece bem a estrada.

Sobre o depois sabe-se muito pouco. Soa-me difícil pensar até sobre o próximo almoço. A memória das vivências famigeradas de uma dor confundida com sorte faz a melancolia da autopiedade virar uma desculpa para toda a falta de atitude. A embriaguez de fazer por sorrisos. A ânsia de não conseguir contar nos dedos as gargalhadas completamente desprovidas de compromisso.

Dentre todas as fases da minha vida, essa talvez seja a de maior loucura e sede de fazer. Experimentando, nas novas e velhas experiências, qualquer alegria ou masoquismo inerente à reciprocidade de quem sabemos que está ao nosso lado. Colecionar momentos sem a necessidade de colocá-los na vitrine. Esperar pelo amanhã com a entrega do hoje. Com a necessidade de ser pleno a cada segundo. A cada respiração.

Todas as vontades concebidas em uma mesa de bar são a prova de que a vida pode começar outra vez a cada gole dado. A falta de consciência vivenciada pela bebedeira talvez seja a realidade que vivemos, só que na ressaca. É a verdade de um ser encrustada na dor de cabeça do dia seguinte. A expectativa por viver que acaba sendo enclausurada pela imposição de uma cura que não queremos que aconteça. Constantemente curam-nos da felicidade de ser. Da liberdade de não ter que apenas existir e cumprir com um protocolo que impuseram pra isso.

Nessas idas e vindas e nesses encontros e desencontros entre goles de vida e vontade, sou surpreendida por existências que transbordam meus dias. É verdade, quem sabe, que também por falta de intensidade a quem deposito toda a minha, mas, ainda assim, aprendizado e dinâmica viva. Entre entregar-se e receber pouco e não se entregar, prefiro entregar todo o meu ser. A busca pelo outro só faz sentido se for por uma questão de transbordamento. Nossas lacunas são apenas falta de embriaguez pela vida. E os goles, esses somente nós podemos dar.

 

THIANE ÁVILA.

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