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Thiane Ávila

Autor: Thiane Ávila

Estou fora

24/5/2016 - São Roque - SP

A máfia da liberdade equivale à tentativa de usurpar os sentidos latentes de um anarquismo pessoal. De uma renúncia aos desquereres que não prevalecem no seio de quem precisa sair de um lugar a nenhum outro. De quem necessita, pois, emancipar a própria liberdade de querer-se preso apenas ao que se cria na ideia, esvaindo, vez que outra, em poesia. Versos que sempre serão um transbordamento do que não se consegue exprimir, do que não respeita os limites das grades que irrompem os vestígios. Que inoculam a iniciativa de decidir sobre pertencer ou não. De validar o silêncio não como um consenso de quem espera sempre o mesmo, mas de quem reflete antes de enunciar. Ou de quem enuncia a necessidade de não refletir por uma questão de dar, pois, asas às consequências obscuras. Ao breu que ninguém tem coragem de dar voz.

Nos tempos mais sombrios de minha existência, constato exigências de loucuras. Ouço a voz da expressão enjaulada na cultura de quem foi ensinado a não transgredir. Nesses passos conformados com a rota, estremeço pela ânsia ao periférico. Não se trata sempre do conteúdo, mas do contorno. Nem sempre do projeto, mas da engrenagem. Por entre as brechas enaltecidas pelos detalhes escandalosamente escondidos, configuro o olhar ao enquadramento chulo do que negam a inferir. Sou pretexto para a vulgarização dos hiatos, repartindo as desternuras no mais sutil abraço de quem sabe o que uma minoria sofre. De quem nasceu, pois, para escandalizar o recatado. Para pichar, com tinta de sangue, o discurso acefálico das rotinas promotoras de ordem. Dos hábitos guarnecidos da seriedade de ser social. Animalize-me, pois.

E nesse descompasso de trejeitos sãos e loucos, visto de transparência e nudez a perspectiva do novo. Esclareço aos que me ouvem a antiguidade do futuro, a brevidade da promessa pelo eterno. De paliativa já basta a vida que nos impõem. De besta já bastam os encantos e valores promulgados em sátira aristocrática de privilegiados. No meu canto, o lugar ideal aos desgarrados e suplentes por não serem perdoados de seus acertos de amor e evolução. De suas conquistas legítimas pelo direito de existir da forma que convier. Por dentro, tão somente a lacuna transpassada pelas vozes silenciadas um dia, pelos sorrisos desconfigurados pela violência de uma renúncia forçada. O motivo é sempre a essência renegada. Que sejam, pois, jogados ao vento os motins pela ordem e pelo progresso, se para isso é preciso a vitimização dos apelos ilegítimos. A inferência nojenta de uma mudança por vias fraudulentas. Na minha poesia, apenas o excesso de quem não cabe em si.

De palavra em palavra, cresce-se a rebeldia de quem não se curva à natureza de expressar-se. No silêncio, o barulho ensurdecedor do protesto à eloquência surda dos direitos. À efetivação, finalmente, da simples vontade de viver sem a dignidade definida em mesa hipocondríaca. Por não ser digna, rejuvenesço, a cada tapa, o retrocesso do avanço dos escolhidos. Sem querer sondar a premissa que os abstêm das mesmas penas de meu amor incongruente aos repositórios, apenas vivo a serenidade de quem não se estabelece como desejam. Aos poucos, por sorte, dando as mãos a quem, na mesma sintonia e agonia, encontra-se fora. Nessa levada, procurando a deixa para o improvável que parece tão óbvio. A facilidade de apenas não ser intolerante por não fazer parte, por não ter que limitar seus excessos pelo reles motivo de precisar ser incorporado ou incorporar o que parece ser o ideal.

Em todas as indignações, meu corpo se abastece de prosa e remanso. Tenta encontrar, pois, na rima e na negligência um pretexto para não se desequilibrar do que já está condenado à queda. Assim, a clareza sobre se manter em compasso tão somente com o próprio trajeto, pois, dos outros, já estou desvanecida há muito tempo. No tempo imposto, minha sentença já foi anunciada. Estou fora justamente por ser fiel ao discurso mascarado de mito dos que excluem. Estou fora por medir as consequências que dizem medir. Estou fora por estudar as referências legítimas que dizem seguir. Estou fora, finalmente, por amar a existência com todas as vicissitudes que dizem precisar punir.

 

THIANE ÁVILA.

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