ColunistasCOLUNISTAS

Thiane Ávila

Autor: Thiane Ávila

Vida diátese

6/3/2017 - São Roque - SP

Se parar pra pensar, os dias são tendências ao desgaste. Empurrões pras tentativas incertas sobre o que nem se sabe. Não se vê e, não poucas as vezes, não se sente. Comandos involuntários de uma força secular e paralela aos instintos. Produtora de sentido e afanadora de significados. Pelas ruas, observamos os olhares como quem busca por respostas antes das perguntas. Toda e qualquer ansiedade reside na deficiência de perguntar - ou na prepotência de querer responder.

Ontem, andando por debaixo do céu escuro, vi iluminar na fronte o derrame do fim.  As circunstâncias apaziguam, por certo, as tenras horas de adeus, mas dão corpo às adaptações e propensões a se desenvolverem. Tiro do rosto a máscara da espera e liquido de vez as indagações sobre o que só devaneia a vida. A diátese é um entendimento que se tem como certeza - produz predisposição ao doente. A sociedade doente é viral à medida que adoecemos pelas perspectivas. Pelas barreiras. Pelas beiradas.

O melhor de viver talvez esteja na ambição pelos segundos e nada mais. Dando as mãos ao vento e compreendendo a ligeireza dos anos em contraposição à vagarosidade dos dias, é possível se dar conta da arrogância dos planos. A vontade que manipula é o carro-chefe de uma civilização doente. Cancrosa. Inconscientemente suscetível às mortes em nascimento - os papéis de invertem e as inversões se organizam. Eis o caos. O recomeço. A diátese.

Ser um balão de emoções em um mundo de alfinetes é a ansiedade programada pra não deixar nunca de ser. O medo de tudo para com tudo e com todos assemelha-se ao hipocondríaco das sensações. Evita-se. Ignora-se. Não se dispõe. Não se trata de enterrar as certezas e abrir mão dos próprios erros, mas conservar a dignidade de poder viver sem frustrar-se pelo desmanche. Sem querer se afastar da dor. A fronteira, pois, entre o merecido e o conquistado está apenas no caminho que se escolhe. O câncer social está em só conquistar.

Na minha janela, pude vislumbrar o requinte que a simplicidade tem quando anda sintonizada com os sorrisos. A diátese dessa vida é a propensão à morte natural. Sepulcral. Quis, por muitas vezes, doar os sentimentos pra poupar o soluço e a agonia que a impotência do amor vez que outra impõe. É admitir uma importância que se transforma em extensão. É arriscado, dói e, não raramente, consome. Rói os órgãos como um parasita incorruptível. Irrevogável. A vida diátese, pois.

 

THIANE ÁVILA.

Compartilhe no Whatsapp