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Thiane Ávila

Autor: Thiane Ávila

Marcas

1/1/2018 - São Roque - SP

Olhando para as marcas deixadas e para aquelas que foram feitas. Enunciando as falhas, os riscos e tudo o que, a toda a hora, é colocado sobre a mesa. Vibrando pelos pesares, pelos choros e pela calmaria. Vivendo num oásis desconstruindo conceitos e palavras que, a priori, não têm valia. Emancipando as dores e mostrando o sangue escorrer pelos olhos. Feito porco-espinho do avesso, permitindo que a dor do mundo corrompa o peito à própria sorte, a fim de que se cresça a cada olhar sobre as pessoas. Felizes aqueles a quem a maldade do mundo magoa, pois a indiferença é o cancro que nos faz silenciar. Olhando as grosserias ao redor e preferindo, pelo comodismo, simplesmente se calar.

O tom da voz, o corte de cabelo e a sobrancelha que marca. As tatuagens emblemando, o aroma das horas fazendo da escrita sempre meu contrabalanço e através da qual meu mundo exala. De posto assumido e de opinião insegura. A hipocrisia da desinformação que se mostra ausente, mas que ainda se julga. Os retratos ensaiados de discursos que engolimos – certa vez me disseram que eu não deveria ir contra meu destino. A sociedade vende quadros de histórias que romantizamos. Pincéis cujas marcas só têm valor se respeitam o ritmo daqueles que em posições de poder colocamos. É inútil a atmosfera fugaz das críticas que não fundamentam e das mudanças que não saem das palavras – veja bem: não estou dizendo que elas são tolas ou fracas. Minha própria revolução é construída em cada texto que escrevo. Torço para que, nesse ano, sejamos abençoados por vontades que se alimentam de coragem e de medo.

As viagens que fazemos são ductos de permanência. Não pertenço a lugares, apenas a mim mesma. As escolhas incompreendidas e as mudanças que me refazem. As marcas são comumente mal-ditas, como se desqualificassem o que, todo o dia, sofre uma catarse. Os anciãos dos tempos já me deram a penalização: não tente mudar o mundo, pois gera apenas frustração. Esse combustível, num paradoxo indissolúvel, corrompe o comodismo e movimenta a dinamicidade. Talvez você seja como eu, daquelas que não fazem nada pela metade. O medo do permanente não me impede de marcar. Os desenhos sobre a pele são poemas que gosto de lembrar. Portanto, silencio nas palavras e uso da metonímia para descrever – poucos escutam o silêncio das palavras que não escrevo para quem pretende apenas me ler.

Em cada brecha do que manifestamos, deixamos nosso mundo parcial. Às vezes não me seguro e acabo deixando sinais de uma linguagem já decodificada para os dispostos a prestar mais atenção que o normal. Mas temos sempre pressa de captar o que vai além dos limites visíveis. O tempo corre e perdemos exatamente a emoção que buscamos ao procurar em lugares icótonos e sem perspectivas verossímeis. Portanto, marcas. Marcas de tempos que nos narram e nos conferem. Esse ano promete outras tantas tatuagens para harmonizar com a bebida que, ao final do dia, transcorre as palavras que, ao contrário do que pensam, são quem, de fato, me escrevem.

 

THIANE ÁVILA.

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