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Thiane Ávila

Autor: Thiane Ávila

Não quero nem a faca nem o queijo, quero a fome

5/3/2018 - São Roque - SP

A questão é que, se não for para tentar de verdade, não vale a pena nem começar. De nada adianta as promessas infinitas, as planilhas organizadas e as horas contadas. Não é preciso que se prenda aos desatinos, que se leia o tempo ou que se espere outros ventos. O que move a gente não é o fim, mas o que fazemos dele no caminho. Afinal de contas, o propósito é uma ilusão bem sacramentada para os entediados e indispostos à falta de sentido.

Tentar pode significar noites mal dormidas e rejeições das mais traumáticas. Pode ser que gere feridas incuráveis e que, no dia seguinte, tire todos os motivos racionalmente traçados para continuar. Pessoas podem ir embora e outras surgirem. A razão tão certa pela vida pode escorrer pelos dedos e fazer com que alguns corações se partam. Está tudo bem: coração não quebra, ele se refaz.

À medida que o tempo desgasta, o corpo pode pedir arrego e as mãos, já calejadas, implorarem para parar no ponto exato da dificuldade. A transversalidade de conseguir visualizar um horizonte completamente oblíquo e fantasiado de verdade. Vive-se por hora. Ama-se por hora. Acredita-se por hora. Quando me dei por conta, percebi que, na maioria das vezes, o choro de ontem vira motivo de risada, e a risada de alguém que nos magoa vira seu próprio choro.

Se não for para tentar de verdade, não vale a pena nem começar. Observar as nuances é o jeito mais correto de se desprender do que parece ser, de fato, correto. Penso que, assim como há tantas cabeças diferentes que pensam, assim acontece com o amor que se constrói em tantos corações que não são iguais. As tentativas, portanto, jamais serão unânimes. A atenção se refere à sua permanência. Não se trata de ter as ferramentas, mas inventá-las. Parar de dar explicação para tudo e fazer com que tudo se explique por si só. Sem rodeios e sem fantasmas do passado. A tentativa é sempre presente, ainda que se trate de tentar interferir sobre algo que nasceu em outro tempo.

Quero a fome porque sei que todo mundo é inacabado. E a ânsia é mais ou menos isso: a busca que não sacia. Não tem como parar de correr atrás, pois o meu alvo muda a cada minuto. Sou a enteada da fugacidade que casou com a paciência. Meus erros desonestos comigo mesma são a única balança capaz de mudar alguma coisa. No fundo, é tudo de dentro para fora. Não quero ser vista por pessoas razoáveis. Elas não entenderiam. Não quero nem a faca nem o queijo, quero a fome.

 

THIANE ÁVILA.

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