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Thiane Ávila

Autor: Thiane Ávila

Bandeira branca, sexta-feira

7/12/2018 - São Roque - SP

Acordei com os lençóis desarrumados e assim os mantive. Com os pés para fora da cama, recitei qualquer coisa inventada na hora apenas para inaugurar o dia que não combina com culpa. Passei o café forte de toda a sexta de manhã e coloquei na térmica preta que me acompanha. Repeti as frases que escrevo para mim, guardadas na porta do meu guarda-roupa, e prometi que exalaria apenas coisas brandas.

Se ela aparecesse na minha frente, estou certa de que deixaria o orgulho de lado e não falaria mais em meias palavras. Com uma rosa feita delas, diria que é amor.  Como a mais idiota das criaturas, entregaria os poemas e os textos, os perfumes e as pedras. Contaria dos sonhos, falaria das energias e desejaria o universo inteiro aos seus pés, com todas as estrelas brilhando ao seu redor. Amor tem disso, ele brilha.

Na padaria da rua do lado, pedi os pães de queijo de costume e fui cantando o mantra da saudade, à moda de quem já sabe toda a história, mas não cansa de ver beleza no sentimento que fica. A magistratura do fim é a ressonância dos inícios. Como é bom lembrar sobre ter amado. Como é carinhoso saber que se sente sem amargura.

Num caminho à parte, resvalei nas lonas de algumas dores, mas ainda assim decidi reler o velho livro com a certeza da inspiração aproveitada. Ao final, sobram sempre as palavras e mais nada. No fundo da gaveta, meu colar amarelo-queimado costuma exalar o cheiro de incenso massala das noites em que estivemos genuinamente unidas. Depois de algumas doses de receio. Após algumas brigas por teimosia. Sou apenas a vontade de fechar um capítulo e começar o próximo.

Se essa tarde de sexta-feira não for capaz de me iniciar na tormenta da noite que antecede um sábado insólito, correspondo com pesar as infinitudes dos copos que só servem para abençoar as citações vazias de coisas que ninguém entende. Pelos bares e esquinas, andando ao escrever ou escrevendo o que anda, retiro a responsabilidade de quaisquer entonações do que se leu acima. Peço e estendo, hoje, apenas bandeira branca. Sem ressentimento, sem expectativa. Apenas mais uma noite de sexta iniciando com o refil dos copos em noite meio quente, meio fria.

 

 

THIANE ÁVILA.

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