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Thiane Ávila

Autor: Thiane Ávila

O estado fetal dos sentidos

2/9/2019 - São Roque - SP

Abocanhar o vento com a mesma sede de tornar os objetivos uma sincronia perfeita com o ato de existir. Transmutar, em verso, as revelias absurdas do óbvio que nos contempla, dando adeus às amostragens desencaixadas dos lugares onde tentam nos colocar. Soar como brisa leve ao único tempo possível, realocando as linhas e transpondo as matrizes das construções passadas de versões que já não existem mais.

Sentir com os olhos as emoções resguardadas em cada detalhe, dando risada às mesmas risadas que riem da expressão do ridículo que permitimos evadir. Trocar com o silêncio as percepções atualizadas sobre as pessoas que merecem nossa atenção, resguardando, no ofício dos esforços, apenas o que possa vir para acrescentar. Com lentes de aumento nos ouvidos, cocriar as partituras necessárias para sermos, aqui e agora, aquilo que queremos ser.

Ao trocar olhares com o sol de domingo, lembrar a claridade dos gestos despretensiosos para gerar os resultados almejados. Contemplar a riqueza do que é naturalmente subverso, a fim de nunca deixar de estranhar a normalidade. Compilar o casual no rol das novidades, objetivando fazer da rotina a maior aventura de nossas vidas.

Dançar com as mãos absortas ao acaso para entender que o novo naturalizado é apenas uma versão contemporânea da reprodução de comportamentos antigos. Sentir-se incomodado, fatigar os questionamentos e rearticular as próprias nostalgias para, num plano multidimensional, conseguir arquitetar os exageros passíveis de transbordar em arte e melodia. Usar trilhas sonoras para as manhãs de segunda-feira, jogando aos sentidos a gratuidade de estar aberto à sensibilidade do tempo e dos encontros.

Entender, quem sabe, que a profusão dos olhares reside justamente na leveza das impressões, descolando-se dos ensinamentos bipartidos e extremistas sobre o valor dentro dos mesmos contextos. Significar a coexistência das benfeitorias e dos maus pensamentos como um conjunto necessário à articulação da constância do crescimento é vital para desenvolver a habilidade de se ter paciência com o nosso processo evolutivo.

Saber da imperfeição por trás dos gestos intencionados para serem perfeitos, ouvindo das próprias manifestações corpóreas o que deve ficar. Aprender que o processo de criação imprescinde do ócio é a chave ancestral para reposicionar as certezas obsoletas do que depende do momento presente para significar. 

Perceber a organização das sequências é notar que, antes dos pensamentos, vem o silêncio. Antes das palavras, vêm os gestos. Antes das escolhas, vêm as dúvidas. Antes das respostas, vêm as perguntas. Silenciar o verbo é a fórmula que inicia a equação das pontes que criamos para nos movimentar a todo o momento. Saber comunicar as próprias medidas é colocar à frente dos impulsos o que pulsa em nossos ocultamentos. Ser o nosso próprio silêncio é das formas mais honestas de existir do modo que entendemos que somos.

 

THIANE ÁVILA.

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