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Rogério de Souza

Autor: Rogério de Souza

São Roque na era das eleições dos 3 S’s  

1/10/2016 - São Roque - SP

É comum escutar de cidadãos com mais experiência de vida que as antigas eleições, antes do Golpe Civil-Militar de 1964 e os pleitos de 1982 e 1985, foram vencidas por aqueles candidatos que apresentavam disposição para andar, possuíam facilidade de convencimento e não tinham medo do corpo a corpo. Ou seja, para eleger-se naqueles anos não necessitava-se de muito dinheiro, mas de sola de sapato, saliva e suor – os 3 S’s.

A partir das eleições presidenciais de 1989 esse cenário alterou-se e o que se assistiu de lá para cá foram verdadeiros espetáculos que não deixam a desejar aos shows de intervalo de esportes estadunidenses como o Super Bowl. Os showmícios passaram a imperar e os discursos inflamados dos políticos foram substituídos por canções e artistas da música pop e sertaneja. O apogeu desse panis et circense registrou-se nas eleições presidenciais de 2002.

Dessa forma, nos últimos pleitos brasileiros gastou-se rios de dinheiro nas campanhas e o poder econômico tornou-se o aspecto essencial para eleger um candidato. Nas eleições de 2012 para a cidade de São Paulo, o gasto total dos candidatos a prefeito alcançou a cifra de R$ 180 milhões declarados na Justiça Eleitoral.

Objetivando diminuir o poder econômico e democratizar os instrumentos de escolha política do cidadão brasileiro, a Justiça Eleitoral vem adotando uma série de medidas – algumas caracterizadas por forte contradição -, entre estas a proibição do nepotismo, lei da ficha limpa, fim dos showmícios, o mandato parlamentar atrelado ao partido político, entre outras.

No segundo semestre do ano passado aprovou-se a lei nº 13.165/2015, denominada “minirreforma eleitoral”. Entre as mudanças mais importantes desta lei está a regra que define que as campanhas eleitorais serão financiadas exclusivamente por doações de pessoas físicas (limitada a 10% do rendimento bruto do ano anterior) e pelos recursos do fundo partidário, não sendo possível, portanto, doações de empresas. Para mensurar os possíveis efeitos dessa medida nas campanhas políticas, nas eleições presidenciais de 2014, as pessoas físicas contribuíram com apenas 21% do total arrecadado pelos candidatos, partidos e comitês.

A minirreforma de 2015 também estabelece que nas eleições deste ano o limite de gastos na campanha deverá ser até 70% do maior valor gasto declarado para os cargos de prefeito ou vereador das eleições de 2012. Até a eleição passada, os próprios partidos definiam quanto queriam gastar. A nova lei também determina redução no tempo para conquistar votos (45 dias), proibição de outdoors, cavaletes e pintura em muros.

Diante desse novíssimo cenário, analistas da seara política afirmam que neste ano as campanhas serão mais enxutas, austeras e que nos pequenos e médios municípios o corpo a corpo voltará a ser elemento fundamental para eleger um candidato. No entanto, críticos avisam que o tiro poderá sair pela culatra devido ao costume enraizado da prática do caixa dois - doações de pessoas físicas e empresariais sem declarar à Justiça Eleitoral.

No microuniverso de São Roque, as eleições de 2008 foram marcadas por extravagância e visível excesso do poder econômico. Na primeira semana de permissão para divulgação da propaganda eleitoral, centenas de jovens foram colocados em diferentes pontos do centro da cidade balançando bandeiras verdes. Paralelamente a isso, um caminhão de som no estilo trio elétrico circulou pela cidade todos os dias difundindo um jingle em uma altura ensurdecedora. Nas eleições municipais de 2012, os dois candidatos que disputaram a dianteira também recorreram a uma espalhafatosa propaganda política, especialmente com jovens perambulando com bandeiras para cima e para baixo.

Nas eleições deste ano, os seis candidatos a prefeito de São Roque poderão gastar, cada um, até R$ 275 mil reais. Cada vereador poderá comprometer até R$ 35 mil. Dessa forma, na Terra do Vinho, como em boa parte do Brasil, vislumbra-se menos caminhão de trio elétrico, pessoas balançando bandeiras e santinhos espalhados no chão e mais a prática de ganhar o voto a partir do corpo a corpo, caminhada pelos diferentes bairros e conversas para divulgar propostas.

A minirreforma eleitoral de 2015 objetiva, pelo menos teoricamente, baratear as campanhas, aumentar a transparência na prestação de contas dos candidatos e partidos e diminuir a influências do poder econômico sobre o pleito, isto é, retomar as eleições dos 3 S’s. Para isso, foca suas ações contra atos ilegais historicamente desenvolvidos por partidos políticos, agentes públicos (Estado) e empresas. No entanto, a corrupção não concentra-se apenas nessas instituições, mas espalha-se por grande parcela da sociedade. Infelizmente, no período eleitoral ainda é comum encontrar nas ruas de diferentes cidades brasileiras pessoas pedindo caneta, boné, camiseta, etc. ou mesmo barganhando o voto em troca de um emprego.

Portanto, as últimas medidas para democratizar o processo eleitoral e diminuir a influência do poder econômico (proibição do nepotismo, lei da ficha limpa, mandato do partido, fim do financiamento empresarial, etc.) não surtirão efeitos se parte significativa da população brasileira continuar aceitando e, no limite, estimulando práticas ilícitas. 

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