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Rogério de Souza

Autor: Rogério de Souza

100 ANOS D’O DEMOCRATA E A ESFERA PÚBLICA  

9/5/2017 - São Roque - SP

Há 10 anos, quando decidimos nos estabelecer no município de São Roque, adquiri um exemplar do jornal O Democrata para consultar a seção “Classificados”. De lá para cá, praticamente em todos os finais de semana, acompanho as notícias sobre a vida social, segurança e política da cidade e região nas páginas desse importante periódico.

Depois de ouvir em clube recreativo a expressão “você é gente de quem?”, foi por meio das páginas d’O Democrata - principalmente nas seções de coluna social – que conheci os sobrenomes das principais famílias da Terra do Vinho, com destaque para os desbravadores deste vale homenageado com o título de São Roque.

Na parte policial percebi que São Roque não era tão pacata como leituras apressadas poderiam sugerir. Nesses 10 anos, crimes diversos e de alta periculosidade foram registrados nas páginas do jornal. Entretanto, isso não permite comparar a sensação e efetiva segurança da cidade em relação às grandes metrópoles brasileiras. Mesmo não sendo tão tranquila, a Terra do Vinho é um excelente local para morar.

Os são-roquenses, especialmente aqueles que não conseguem acompanhar as discussões na Câmara de Vereadores, atualizam-se sobre as decisões e dinâmica políticas pelas páginas do periódico. Nos finais de semana, é comum encontrar munícipes debatendo as vicissitudes da esfera pública local depois de ler um artigo e/ou reportagem d’O Democrata.

O pensador alemão Jünger Habermas indica como condição para o desenvolvimento de uma experiência democrática qualificada a existência daquilo que denomina de esfera pública. Esta seria representada por uma dimensão do social que atua como mediadora entre o governo e a sociedade. Para que a opinião pública se consolide, a liberdade de expressão, de reunião e de associação teriam que existir manifestando-se através de organizações como jornais, editoras, rádios, TV, sites e blogs de notícias. No caso do município de São Roque, O Democrata poderia ser apontado como um impulsionador da esfera pública local, isto é, um efetivo colaborador para o aprimoramento da experiência democrática qualificada praticada na Terra do Vinho.  

Admirando o trabalho de fomento da esfera pública desenvolvido pelo jornal e sua história – fundado em 1º de maio de 1917 em plena Greve Geral -, passei a escrever, de maneira não muito regular, no semanário. Na primeira conversa com o professor Élcio Boccato, diretor do semanário, combinamos que escreveria, primeiramente, textos sobre política internacional e cultura, depois expandi o leque de temas.

Com o passar dos meses compreendi que para publicar os textos era necessário realizar um ritual: visitar o diretor naquela semana. A visita não objetivava a aprovação do artigo, mas conversar sobre diferentes assuntos, eventualmente do tema do escrito. Nesses bate-papos, quando o assunto era política nacional, o professor Élcio virava um objeto, espécie de porta-canetas, mostrava uma imagem e falava da época que disputou as eleições locais por um partido de esquerda. Outras conversas versavam sobre o tamanho do texto e a possibilidade de “cortar” um parágrafo. Muitas vezes não entrávamos em acordo e o artigo ficava para a próxima semana. Na despedida, independentemente do desfecho, sempre ouvia do professor Élcio, “continue escrevendo!”.

Equilibrando-se entre a difícil tarefa de praticar uma imprensa livre e crítica, de um lado, e não sucumbir às pressões das diferentes gestões locais, de outro, O Democrata completa 100 de existência – um feito alcançado por pouquíssimos jornais no país. Defendemos que para o município desenvolver todo o seu potencial e melhorar a vida da sua população de forma irrestrita, precisará de uma esfera pública dinâmica e isto perpassa, necessariamente, pela atuação do semanário dos Boccato. Parabéns pelos 100 anos!

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